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Editorial - 04/02/2019 | 07h08m

Imprensa nacional

Há quase 30 anos no jornalismo profissional com a devida graduação, chego à conclusão de que a idade é o fator X para a interpretação dos fatos.

Certo dia, o telefone toca. Do outro lado, uma repórter de um canal local afiliada de uma grande emissora de tevê do Brasil. Motivo da ligação? Uma entrevista minutos depois sobre um assunto que de nada ela conhecia. Levei um susto. Sair da afiliada onde chegara para trabalhar sem nada ter conhecimento da rotina de trabalho do dia. Aceitei e instantes depois estava na entrevista. Éramos conhecidas. Fui relatando os fatos em detalhes. Ela dava ordem para que outro funcionário gravasse tudo. No estúdio, faria o que a ela e ao seu editor interessasse para ir ao ar. Quando liguei a tevê, fiquei frustrada. Gravou mais de UMA HORA e para o público passaram “frações” de segundos. Comecei a interpretar a imprensa televisiva de forma negativa e real, concluindo: como enganam o telespectador e muito.

Com o passar dos anos, iniciei a pergunta: Quem paga e como para a máquina funcionar do jeito que é? Não demorou muito para achar a resposta e foi o bastante para mudar o ponteiro do meu relógio. Desisti de assistir novelas diárias. Desisti de assistir programas matinais de entretenimento e vespertinos idem. Passei a interpretar âncoras de programas vespertinos. Desisti de assistir programas da tarde e por fim, o aparelho de tevê fica mais desligado que prendendo minha atenção.

Acredito que a imprensa nacional acionou o botou do meu pensamento, fazendo com que milhões de pessoas como eu fizessem a mesma coisa.

Hoje qualquer um é jornalista: radialista, padeiro, confeiteiro, lixeiro, doméstica, do lar e por aí vai. Basta ter um celular nas mãos. Nada que necessite interpretar algo. Basta uma foto ou um vídeo para se chegar à conclusão: é jornalista.

O personagem principal muda de endereço quando encontra um processo judicial pela frente. Daí a cena muda de figura. Quase ninguém tem a graduação com registro no órgão competente, ou seja, jornalista é algo em extinção como agulha no palheiro. Pouquíssimos são e bons mesmos, raríssimos.

Quando o fato entra AO VIVO na programação, pode-se medir o grau de conhecimento do jornalista ali apresentado: não sabe fazer pergunta, não sabe improvisar nem sabe envolver o entrevistado. Apenas sabe LER o que lhe dão para executar naqueles breves minutos e mais nada. Temos uma imprensa partidária. Não sou. Temos uma imprensa de salão de beleza. Não sou. Temos uma imprensa sem documentos. Não sou. Temos uma imprensa movida por interesses empresariais. Não sou. Temos uma imprensa vazia de conteúdo. Não sou. E quando se pergunta a um deputado federal recém-empossado (Paulo Ganime/NOVO/RJ), “se o mesmo levantará a bandeira do deficiente, porque o parlamentar é deficiente físico?”, chega-se ao cúmulo do absurdo.

O que vivemos é uma imprensa deficiente de memória, conteúdo, observação, interpretação e liberdade.

Atualmente lamento pelos jovens com a cultura acéfala pregada pelos meios de comunicação de massa nas humildes residências, onde o cordão umbilical repousa. Confesso, que troquei meu canal e diante desse Editorial, desliguei minha tevê com um significativo “ponto final”.

Está ruim e está demais da conta.

Eliete Fonseca
Jornalista Profissional
Registro 18.902/RJ